quinta-feira, 19 de abril de 2012

Exploração sexual de crianças e adolescentes

Depois de um tempo sem atualização do blog, o texto de hoje vai abordar uma questão bastante delicada e, porque não dizer, polêmica: a exploração sexual de crianças e adolescentes. Num primeiro momento cabe aqui definir o conceito de exploração sexual. “A exploração sexual comercial infantil é todo tipo de atividade em que as redes, usuários e pessoas usam o corpo de um menino, menina ou de adolescente para tirar vantagem ou proveito de caráter sexual com base numa relação de exploração comercial, de poder e declara que a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é um crime contra a humanidade” (Leal, 1999 apud Libório e Sousa, 2004, p. 22).

Você já parou pra pensar o que leva uma criança/adolescente ao mercado de exploração sexual? Você compartilha de idéias do tipo “ele(a) se prostitui porque quer” ou “estava pedindo pra ser estuprado(a)”? Se sim, precisamos discutir outras questões antes de falarmos sobre as causas/motivos que levam essas crianças/adolescentes a serem explorados sexualmente. Talvez você esteja achando estranha a forma como estou me referindo ao tema (ex.: serem explorados sexualmente). Isso mesmo! Crianças e adolescentes não se prostituem, eles são explorados sexualmente. O termo prostituição infanto-juvenil foi abandonado por implicar numa possibilidade de escolha voluntária, ocultando o caráter de comportamento sexualmente abusado.

Muitas vezes nem as próprias crianças/adolescentes tem noção disso. Em uma pesquisa, quando perguntadas sobre essa questão (se estavam sendo explorados) 60,3% responde que “não”. Segundo Diógenes, “o juízo de valor e o senso comum sancionam incondicionalmente quem é inocente ou merecedor de culpa e repulsa, ou mesmo quem merece o cárcere ou a liberdade dessa cadeia ilógica que oprime e comercializa sonhos e indivíduos” (2008, p. 51). Sendo assim não surpreende que os próprios envolvidos, que na verdade não vítimas (isso mesmo!) não reconheçam seus direitos e, muitas vezes, vejam a si próprios como merecedores da situação.

A rua, espaço ocupado por essas crianças/adolescentes, também apresenta uma série de contradições. Diógenes aborda muito bem essa questão quando coloca que as crianças e adolescentes inseridos nesse contexto de exploração sexual “não são, simplesmente, meros transgressores sociais ou vítimas em potencial de violências muitas durante a vida. Mais que isso, são heróis lúdicos que brincam entre os riscos do ato de fazer programa e a dor da violência iminente. Eles não perderam por completo a fantasia e a ludicidade. Apenas a recalcaram nalguma gaveta imaginária ante a emergência e os conflitos cotidianos, e, quando podem, mesclam os riscos do dia-a-dia das ruas a formas diversas do brincar e do rir” (2008, p. 52).

É necessário ter muito cuidado ao falar nas causas de exploração sexual, afinal, são muitos os fatores envolvidos: sociais, econômicos, culturais, etc. No que se refere ao gênero, a maioria (68,3%) é do sexo feminino. É preciso ter cautela ao interpretar esse dado para que não nos deixemos tomar pela idéia, ainda bastante difundida na nossa sociedade, de algumas mulheres “pedem pra serem abusadas porque se oferecem, usando roupas curtas, etc”. Sendo assim, o gênero não seria a causa da exploração sexual, mas pode ser considerado um fator de risco.

Outro dado alarmante é relativo à inserção na escola. Segundo a pesquisa mencionada anteriormente, 75,3% das crianças/adolescentes inseridos na rede de exploração sexual não freqüentam a escola. De acordo com a autora da pesquisa, a escola representa para essas crianças/adolescentes uma conquista a longo prazo e acaba sendo colocada em segundo plano diante da urgência das necessidades e vivências da rua. Afinal, a prioridade passa a ser a sobrevivência.

Nesse sentido, torna-se indispensável mencionar em que condições sociais vivem essas crianças/adolescentes. Na pesquisa foi identificado que a maior motivação de entrada e permanência na rede de exploração sexual é econômica. Junto disso, está o imaginário popular de facilidade em ganhar dinheiro com a venda do próprio corpo: “riscos devidamente calculados e controlados, pagos sob a perspectiva maquiavélica de que ‘o fim justifica os meios’. E, segundo essa lógica, valeria a pena, pois os lucros econômicos seriam vultosos” (Diógenes, 2008, p. 66).

Outros fatores como drogadição, laços familiares fragilizados ou rompidos, baixa auto-estima, pouca escolarização, medos, angústias e sofrimentos, por exemplo, estão vinculados à entrada e permanência de crianças e adolescentes na rede de exploração sexual. Segundo o artigo 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. Diante da difícil realidade que está posta diante dos nossos olhos a pergunta que não quer calar é “o que fazer para garantir esses direitos?”. Certamente a resposta envolve uma série de questões como, por exemplo, em termos de educação e políticas públicas.

Pra finalizar (o texto não a reflexão), vale citar o artigo 4º do ECA que diz que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”. E de novo a pergunta: o que fazer para garantir esses direitos? Como cidadãos, temos o dever de denunciar os casos de suspeita de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. É preciso romper com o pacto de silêncio que encobre as situações de abuso e exploração contra crianças e adolescentes. Não se pode ter medo de denunciar. Essa é a única forma de ajudar esses meninos e meninas. A denúncia é gratuita e anônima e pode ser feita através do Disque 100. Faça sua parte!

Referências:

Diógenes, G (2008). Os sete sentimentos capitais: exploração sexual comercial de crianças e adolescentes. São Paulo: Annablume.

Estatatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm

Libório, R. M. C. & Sousa, S. M. G. (2004) A exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil: reflexões teóricas, relatos de pesquisa e intervenções psicossociais. São Paulo: Casa do Psicólogo.